Pais estão preparados para retirar de casa alimentos que fazem mal?

Alexandra Campos, in Jornal Público
29 de Julho de 2017

"Se uma mãe ou um pai não comem peixe nem sopa em casa como é que podem exigir que a criança coma peixe ou sopa na escola?". A pergunta é Pedro Graça, director do Programa Nacional para a Alimentação Saudável.

Cinco anos depois de o programa da alimentação saudável ter sido criado, que balanço faz? Os portugueses estão a comer melhor?
Temos agora informações suficientes para tomar decisões políticas. Um manancial de informação que inclui o inquérito alimentar nacional (o anterior tinha sido feito em 1980), o inquérito nacional de saúde com exame físico, um conjunto de ferramentas que nos permitiu tirar uma fotografia. E esta fotografia diz-nos que temos uma população que está a aproximar-se dos hábitos alimentares do resto da Europa, a comer mais carne e produtos de origem animal, mas que mantém um consumo relativamente elevado de frutos e hortícolas.

Percebemos também que há variações no consumo e na saúde que são aparentemente muito condicionadas pelos estratos sociais das populações. Quando a população é menos escolarizada, tem, por exemplo, o dobro da prevalência da obesidade. Isso também acontece na diabetes, hipertensão, displidemia, todas as patologias que são crónicas.
Esta população medicada e doente crónica é muito mais frequente nos estratos com menos escolaridade, menor capacidade económica, maior vulnerabilidade. Esta informação serve também para desmontar uma falsa ideia. O facto de obesidade poder estar agora estável não significa que não possa estar pior nas classes sociais mais baixas. É uma falsa sensação de estabilidade e isso vai obrigar o SNS e os profissionais de saúde a uma atenção diferenciada a esta população.

Ter muita informação não chega. O facto de as pessoas saberem que determinados produtos fazem mal não as impede de continuarem a comprá-los, até pelo ambiente em redor que apela constantemente ao seu consumo.
Sim, mas mudar o ambiente obesogénico significa duas coisas: actuar dentro e fora de casa. Primeira questão: estão as famílias preparadas para retirar de casa uma série de produtos que fazem mal, dando os pais o exemplo aos filhos?

As pessoas que mais copiamos são os nossos pais. Se uma mãe ou um pai não comem peixe nem sopa em casa como é que podem exigir que a criança coma peixe ou sopa na escola?
Um dos principais fornecedores de sal da nossa alimentação ainda é a sopa que comemos em casa. Somos muito permissivos com o sal e o acúcar, sabendo nós que são produtos de alto risco – para a hipertensão, o AVC, o cancro de estômago e outros tipos de cancro. Raríssimas vezes mandamos a sopa com sal a mais para trás num restaurante, há essa permissividade social.

Com a população mais desfavorecida estão a construir uma resposta diferente?
É uma mudança de paradigma. Temos estado a trabalhar com o Ministério da Segurança Social. A ajuda alimentar a pessoas carenciadas é baseada na oferta de alimentos em formato de cabaz. O cabaz [tradicional] tinha uma quantidade elevada de produtos com muito acúcar, como bolachas, com muita massa, arroz, etc. Aumentámos determinados produtos como feijão, grão, leguminosas, introduzimos hortícolas, carne e peixe. Estamos agora a construir uma formação para formadores que depois possam ajudar estas pessoas a saber gerir um cabaz deste tipo.

Também estamos a promover produtos que são promotores de saúde. O nosso drama é que não há marcas de frutos e hortícolas. Se não for o Estado a promover, não há marketing de alfaces… E temos que promover este tipo de produtos junto das crianças desde muito pequenas. Outro problema: numa sociedade de informação, a quantidade de lixo informativo é brutal.

Os hospitais, as instituições públicas devem perceber a responsabilidade que têm de passar informação de qualidade, funcionar como faróis para orientar as pessoas no meio de toda esta confusão."

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